Barragens do Alto Tâmega - Avaliação do EIA pelo GEOTA
Parecer sobre o estudo de impacte ambiental dos Aproveitamentos Hidroeléctricos de Gouvães, Padroselos, Alto Tâmega e Daivões
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Antecedentes e objectivos
Os aproveitamentos eléctricos de Gouvães, Padroselos, Alto Tâmega e Daivões, designados conjuntamente por Sistema Electroprodutor do Tâmega (SET), fazem parte do conjunto de dez aproveitamentos identificados no Plano Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEH). O PNBEH, criado em 2007, fixa uma meta de 7000 MW de potência hidroeléctrica a alcançar até 2020.
O PNBEPH e o SET falham no entanto em questões fundamentais ao nível dos seus objectivos:
1. Diminuir a dependência energética de Portugal em relação ao exterior. Uma aposta na eficiência energética é uma solução muito mais eficaz e sustentável, quer do ponto de vista económico, quer do ponto de vista ambiental. A prioridade da política energética deveria ser investir em novas formas de produção, conservação e transporte de energia, cujo desenvolvimento vai sendo adiado por projectos como este. O conjunto do PNBEPH representa menos de 1% da energia final do País (o SET cerca de 0,2%). Investimentos em uso eficiente da energia têm uma relação custo/eficácia até dez vezes melhor que o PNBEPH, para indicadores chave como a dependência energética e a emissão de gases de efeito de estufa (cf. Melo 2009);
2. Aumentar a capacidade instalada em aproveitamentos eléctricos com bombagem para complementar a energia eólica. É certo que maior potência hidroeléctrica disponível, especialmente em centrais de bombagem, usada em complemento das centrais eólicas, facilita a exploração da rede nacional. No entanto, a possibilidade de instalar sistemas de bombagem em barragens já existentes, em vez de construir barragens novas, bem como a criação de aproveitamentos de “bombagem pura” (com pequena armazenagem) apresentam-se opções inequivocamente mais interessante na vertente ambiental, e provavelmente também na vertente económico (embora esta nunca tenha sido estudada devidamente). Por outro lado, o ênfase colocado no armazenamento de energia por bombagem desincentivará a aplicação de soluções inovadoras, descentralizadas e de menor impacte, por exemplo as células de combustível de hidrogénio ou a rentabilização dos veículos eléctricos ao nível da armazenagem nocturna de electricidade.
3. Melhorar a fiabilidade e segurança do funcionamento do sistema eléctrico português. Sendo certo que maior potência hidroeléctrica disponível facilita o funcionamento do sistema eléctrico, uma redução nos consumos e uma melhoria na eficiência energética do País, em especial apostando em medidas de redução das pontas, cumpririam o mesmo objectivo com vantagens a todos os níveis.
Em síntese, o SET, tal como o conjunto do PNBEPH, é de interesse marginal à escala nacional e tem uma péssima relação custo/benefício. Existem alternativas melhores, social, ambiental e economicamente, para cumprir os supostos objectivos do empreendimento.
Necessidade, potência instalada e financiamento
As potências propostas agora pela Iberdrola para o SET (à semelhança do proposto pela EDP em Fridão, Foz Tua e Alvito, e pela Endesa em Girabolhos) são muito superiores às originalmente previstas no PNBEPH; os investimentos são também proporcionalmente maiores. Potência instalada e investimentos directos apontam para cerca do dobro dos números do PNBEPH (sem contar com os custos de minimização e compensação de impactes, nem custos indirectos como os impactes sociais e ecológicos efectivos, ou os potenciais económicos perdidos p.e. em matéria de turismo de natureza).
Esta enorme disparidade carece de uma justificação que não foi dada e que merece ser escrutinada (não aprofundaremos essa questão aqui porque cai fora do âmbito deste parecer e não temos elementos suficientes sobre a matéria). Três coisas parecem no entanto claras desde já:
1) Admitindo por absurdo que as metas do PNBEPH fossem razoáveis, poderiam ser cumpridas com apenas metade das barragens propostas. Isto é absolutamente claro, já que essas metas foram definidas apenas em termos de potência instalada e não de produção de energia (o que se compreende porque a potência disponível tem alguma relevância no contexto do equilíbrio do sistema electroprodutor, enquanto a energia efectivamente produzida é irrelevante à escala nacional);
2) Como o financiamento destas obras será necessariamente feito através do sistema bancário, que tem fundos limitados para o sector (ainda mais no cenário de crise económica e orçamental que atravessamos), a construção destas e doutras grandes barragens irá constituir uma limitação e concorrência desleal ao investimento no sector do uso eficiente da energia;
3) É de esperar que as empresas eléctricas, neste caso a Iberdrola (mas também provavelmente as outras empresas noutros empreendimentos) obtenham deste negócio lucros desproporcionados face aos danos públicos. Note-se bem que não sofremos de qualquer preconceito ideológico contra lucros honestos! O que está aqui em causa são lucros ilegítimos, obtidos com falsos pretextos mediante a destruição irreversível de um património nacional valioso e insubstituível, com benefício público escasso ao ponto do ridículo, num sector onde não existe um verdadeiro mercado, com preços políticos da electricidade subsidiados pelo erário público, e com favorecimento indevido das grandes empresas eléctricas pelo Estado, em prejuízo dos contribuintes e dos consumidores.
Os aproveitamentos eléctricos de Gouvães, Padroselos, Alto Tâmega e Daivões, designados conjuntamente por Sistema Electroprodutor do Tâmega (SET), fazem parte do conjunto de dez aproveitamentos identificados no Plano Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEH). O PNBEH, criado em 2007, fixa uma meta de 7000 MW de potência hidroeléctrica a alcançar até 2020.
O PNBEPH e o SET falham no entanto em questões fundamentais ao nível dos seus objectivos:
1. Diminuir a dependência energética de Portugal em relação ao exterior. Uma aposta na eficiência energética é uma solução muito mais eficaz e sustentável, quer do ponto de vista económico, quer do ponto de vista ambiental. A prioridade da política energética deveria ser investir em novas formas de produção, conservação e transporte de energia, cujo desenvolvimento vai sendo adiado por projectos como este. O conjunto do PNBEPH representa menos de 1% da energia final do País (o SET cerca de 0,2%). Investimentos em uso eficiente da energia têm uma relação custo/eficácia até dez vezes melhor que o PNBEPH, para indicadores chave como a dependência energética e a emissão de gases de efeito de estufa (cf. Melo 2009);
2. Aumentar a capacidade instalada em aproveitamentos eléctricos com bombagem para complementar a energia eólica. É certo que maior potência hidroeléctrica disponível, especialmente em centrais de bombagem, usada em complemento das centrais eólicas, facilita a exploração da rede nacional. No entanto, a possibilidade de instalar sistemas de bombagem em barragens já existentes, em vez de construir barragens novas, bem como a criação de aproveitamentos de “bombagem pura” (com pequena armazenagem) apresentam-se opções inequivocamente mais interessante na vertente ambiental, e provavelmente também na vertente económico (embora esta nunca tenha sido estudada devidamente). Por outro lado, o ênfase colocado no armazenamento de energia por bombagem desincentivará a aplicação de soluções inovadoras, descentralizadas e de menor impacte, por exemplo as células de combustível de hidrogénio ou a rentabilização dos veículos eléctricos ao nível da armazenagem nocturna de electricidade.
3. Melhorar a fiabilidade e segurança do funcionamento do sistema eléctrico português. Sendo certo que maior potência hidroeléctrica disponível facilita o funcionamento do sistema eléctrico, uma redução nos consumos e uma melhoria na eficiência energética do País, em especial apostando em medidas de redução das pontas, cumpririam o mesmo objectivo com vantagens a todos os níveis.
Em síntese, o SET, tal como o conjunto do PNBEPH, é de interesse marginal à escala nacional e tem uma péssima relação custo/benefício. Existem alternativas melhores, social, ambiental e economicamente, para cumprir os supostos objectivos do empreendimento.
Necessidade, potência instalada e financiamento
As potências propostas agora pela Iberdrola para o SET (à semelhança do proposto pela EDP em Fridão, Foz Tua e Alvito, e pela Endesa em Girabolhos) são muito superiores às originalmente previstas no PNBEPH; os investimentos são também proporcionalmente maiores. Potência instalada e investimentos directos apontam para cerca do dobro dos números do PNBEPH (sem contar com os custos de minimização e compensação de impactes, nem custos indirectos como os impactes sociais e ecológicos efectivos, ou os potenciais económicos perdidos p.e. em matéria de turismo de natureza).
Esta enorme disparidade carece de uma justificação que não foi dada e que merece ser escrutinada (não aprofundaremos essa questão aqui porque cai fora do âmbito deste parecer e não temos elementos suficientes sobre a matéria). Três coisas parecem no entanto claras desde já:
1) Admitindo por absurdo que as metas do PNBEPH fossem razoáveis, poderiam ser cumpridas com apenas metade das barragens propostas. Isto é absolutamente claro, já que essas metas foram definidas apenas em termos de potência instalada e não de produção de energia (o que se compreende porque a potência disponível tem alguma relevância no contexto do equilíbrio do sistema electroprodutor, enquanto a energia efectivamente produzida é irrelevante à escala nacional);
2) Como o financiamento destas obras será necessariamente feito através do sistema bancário, que tem fundos limitados para o sector (ainda mais no cenário de crise económica e orçamental que atravessamos), a construção destas e doutras grandes barragens irá constituir uma limitação e concorrência desleal ao investimento no sector do uso eficiente da energia;
3) É de esperar que as empresas eléctricas, neste caso a Iberdrola (mas também provavelmente as outras empresas noutros empreendimentos) obtenham deste negócio lucros desproporcionados face aos danos públicos. Note-se bem que não sofremos de qualquer preconceito ideológico contra lucros honestos! O que está aqui em causa são lucros ilegítimos, obtidos com falsos pretextos mediante a destruição irreversível de um património nacional valioso e insubstituível, com benefício público escasso ao ponto do ridículo, num sector onde não existe um verdadeiro mercado, com preços políticos da electricidade subsidiados pelo erário público, e com favorecimento indevido das grandes empresas eléctricas pelo Estado, em prejuízo dos contribuintes e dos consumidores.
Impactes do projecto
Conservação da natureza
O EIA reconhece que os impactes resultantes da implantação do SET serão negativos para a maioria das vertentes ambientais analisadas, e frequentemente de elevada importância.
Os aproveitamentos de Padroselos e de Gouvães têm fortes restrições ambientais, por força da legislação nacional e europeia no domínio da conservação da Natureza, que deveriam automaticamente impedir a sua construção. No caso de Padroselos foi identificada uma importante população de bivalves (Margaritifera margaritifera) de elevado valor conservacionista, que apenas será preservada no caso de não construção da barragem. No caso de Gouvães, verifica-se que o aproveitamento está inserido no Sítio de Importância Comunitária Alvão/Marão da Rede Natura 2000, implicando a afectação ou destruição irreversível de habitats protegidos.
Qualidade da água
A qualidade da água é uma das questões fundamentais do empreendimento, face às exigências da Directiva Quadro da Água (DQA). O EIA demonstra sem margem para dúvidas que a qualidade da água no Tâmega e seus afluentes vai degradar-se de forma significativa com o SET. Já se sabia aliás que o conjunto dos aproveitamentos do PNBEPH evidencia riscos sérios para a qualidade da água futura, em especial na bacia do Douro, como é claramente demonstrado no estudo da Arcadis & Atecma para a Comissão Europeia (2009).
O argumento de que seriam retidos nutrientes nas barragens evitando a eutrofização a jusante não é de forma alguma demonstrado e é portanto abusivo: é certo que o azoto não será retido, e nada demonstra que o fósforo o seja (pelo menos não de forma duradoura) — o fósforo é mobilizado quando ocorrem condições de anoxia junto aos sedimentos, o que se afigura pelo menos um risco significativo dada a combinação de má qualidade da água e estratificação térmica espectável abaixo da termoclina na época de estiagem. O EIA não apresenta uma modelação ecológica da eutrofização nem uma cenarização credível da evolução da gestão da água na bacia que permitam uma conclusão diferente desta: com este empreendimento, a qualidade da água na bacia do Tâmega vai piorar significativamente a montante e a jusante das barragens.
Emprego e desenvolvimento local
Em termos de desenvolvimento local, o EIA alega que o SET terá importantes efeitos positivos, na fase de construção, a nível dos empregos e actividades das empresas. Segundo o EIA, “muitos dos trabalhadores necessários à obra poderão ser recrutados nos cinco concelhos da área de estudo, contribuindo para a redução do desemprego e o aumento dos rendimentos das famílias”. É também referido que a construção da barragem provocará um “aumento da população presente e, consequentemente, um aumento do consumo de bens e serviços”.
Conservação da natureza
O EIA reconhece que os impactes resultantes da implantação do SET serão negativos para a maioria das vertentes ambientais analisadas, e frequentemente de elevada importância.
Os aproveitamentos de Padroselos e de Gouvães têm fortes restrições ambientais, por força da legislação nacional e europeia no domínio da conservação da Natureza, que deveriam automaticamente impedir a sua construção. No caso de Padroselos foi identificada uma importante população de bivalves (Margaritifera margaritifera) de elevado valor conservacionista, que apenas será preservada no caso de não construção da barragem. No caso de Gouvães, verifica-se que o aproveitamento está inserido no Sítio de Importância Comunitária Alvão/Marão da Rede Natura 2000, implicando a afectação ou destruição irreversível de habitats protegidos.
Qualidade da água
A qualidade da água é uma das questões fundamentais do empreendimento, face às exigências da Directiva Quadro da Água (DQA). O EIA demonstra sem margem para dúvidas que a qualidade da água no Tâmega e seus afluentes vai degradar-se de forma significativa com o SET. Já se sabia aliás que o conjunto dos aproveitamentos do PNBEPH evidencia riscos sérios para a qualidade da água futura, em especial na bacia do Douro, como é claramente demonstrado no estudo da Arcadis & Atecma para a Comissão Europeia (2009).
O argumento de que seriam retidos nutrientes nas barragens evitando a eutrofização a jusante não é de forma alguma demonstrado e é portanto abusivo: é certo que o azoto não será retido, e nada demonstra que o fósforo o seja (pelo menos não de forma duradoura) — o fósforo é mobilizado quando ocorrem condições de anoxia junto aos sedimentos, o que se afigura pelo menos um risco significativo dada a combinação de má qualidade da água e estratificação térmica espectável abaixo da termoclina na época de estiagem. O EIA não apresenta uma modelação ecológica da eutrofização nem uma cenarização credível da evolução da gestão da água na bacia que permitam uma conclusão diferente desta: com este empreendimento, a qualidade da água na bacia do Tâmega vai piorar significativamente a montante e a jusante das barragens.
Emprego e desenvolvimento local
Em termos de desenvolvimento local, o EIA alega que o SET terá importantes efeitos positivos, na fase de construção, a nível dos empregos e actividades das empresas. Segundo o EIA, “muitos dos trabalhadores necessários à obra poderão ser recrutados nos cinco concelhos da área de estudo, contribuindo para a redução do desemprego e o aumento dos rendimentos das famílias”. É também referido que a construção da barragem provocará um “aumento da população presente e, consequentemente, um aumento do consumo de bens e serviços”.
Sendo certo que serão criados alguns empregos temporários, a experiência demonstra que as consequências em matéria de desenvolvimento local são no sentido oposto ao presumido no EIA. A prática sistemática da contratação de pessoal não especializado para as grandes obras públicas é o recurso a subempreiteiros, que recrutam os trabalhadores nas periferias das grandes cidades e os deslocam temporariamente para o local da obra. Isto é um fenómeno bem conhecido, embora insuficientemente documentado. Os raros estudos feitos sobre a matéria indicam que neste tipo de obras, em regiões socialmente deprimidas, a fracção de trabalhadores de origem local não ultrapassa um dígito percentual — mais vulgarmente, não chega sequer a 1%. Não tem qualquer base factual a esperança, manifestada no EIA, de que o SET gere emprego local relevante – de resto, não é apresentado qualquer estudo ou proposta qualquer medida credível que suporte o desejo da empregabilidade local. Os efeitos locais de animação económica serão transitórios, pequenos, e apenas servirão para criar uma ilusão de crescimento e actividade, como aconteceu no passado em muitos outros sítios (o caso de Alqueva é paradigmático, entre muitos outros).
Mais importante é a questão do desenvolvimento local a prazo, em especial no sector do turismo. No EIA alega-se que, durante a fase de exploração, a presença das albufeiras criará novas paisagens que poderão proporcionar novas oportunidades de desenvolvimento a nível turístico – alegação esta que não é minimamente fundamentada. De facto o argumento é completamente errado, uma vez que o que irá acontecer na realidade será a destruição de paisagens únicas e cada vez mais raras em Portugal. As “novas paisagens” referidas no EIA são vulgaríssimas albufeiras, semelhantes às centenas que já existem em Portugal, e que não trazem nenhuma característica de qualidade ou diferenciadora ao turismo na região (e provavelmente terão limitações ao uso balnear, dada a má qualidade da água).
J. V. Simão (2009) demonstra que:
Mais importante é a questão do desenvolvimento local a prazo, em especial no sector do turismo. No EIA alega-se que, durante a fase de exploração, a presença das albufeiras criará novas paisagens que poderão proporcionar novas oportunidades de desenvolvimento a nível turístico – alegação esta que não é minimamente fundamentada. De facto o argumento é completamente errado, uma vez que o que irá acontecer na realidade será a destruição de paisagens únicas e cada vez mais raras em Portugal. As “novas paisagens” referidas no EIA são vulgaríssimas albufeiras, semelhantes às centenas que já existem em Portugal, e que não trazem nenhuma característica de qualidade ou diferenciadora ao turismo na região (e provavelmente terão limitações ao uso balnear, dada a má qualidade da água).
J. V. Simão (2009) demonstra que:
a) Na região de Trás-os-Montes e Alto Douro, tal como noutras regiões portuguesas e noutros países, não existe uma correlação significativa entre a presença de albufeiras e um desenvolvimento local diferenciado – ou seja, os factores de desenvolvimento são outros que não a presença das albufeiras;
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b) Concretamente nesta região, alguns dos municípios mais pobres encontram-se adjacentes a albufeiras com décadas de existência;
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c) Quanto à criação de emprego: o emprego médio gerado pelo investimento em actividades de turismo rural, de natureza e cultural é, pelo menos, 10 (dez) vezes maior do que o emprego gerado por um investimento equivalente na construção de barragens. Esta demonstração foi feita para o vale do Tua, que apresenta semelhanças com o vale do Tâmega; não é conhecido nenhum estudo similar específico para o Tâmega. Para além da beleza paisagística, o Tâmega é especialmente interessante para o lazer e os desportos de águas brancas, um sector em crescimento e com potencial para crescer muito mais (temática que o EIA despreza).
Património cultural
Em termos de património arqueológico, arquitectónico e etnográfico, o EIA refere que se trata de uma zona bastante sensível, pois possui diversos testemunhos antigos de ocupação humana. São identificados impactes em 50 ocorrências patrimoniais. Destaca-se, no caso do Aproveitamento de Gouvães, o impacte sobre o conjunto megalítico Chã das Arcas, classificado como Monumento Nacional. “Solução” apresentada pelo EIA: rever a classificação atribuída ao monumento, admitindo-se a sua desclassificação, dado o seu estado de degradação e reduzido interesse patrimonial e científico! Solução proposta pelo GEOTA: cancelar o SET, porque tem escassa utilidade e destrói elementos valiosos e insubstituíveis do património natural, cultural e paisagístico nacional.
Impactes cumulativos
O EIA do SET não estuda os impactes cumulativos com outros empreendimentos da bacia do Douro, designadamente em matéria de riscos para as populações locais, habitats protegidos, corredores ecológicos, qualidade da água e erosão costeira. É certo que a sede própria para este tipo de análise seria a avaliação ambiental estratégica do PNBEPH e/ou o plano de bacia do Douro; mas a primeira desprezou completamente o problema, enquanto o segundo está a dar os primeiros passos e não produzirá qualquer informação em tempo útil (além de as ARH terem recebido instruções do Governo para considerarem o PNBEPH como um dado adquirido).
O EIA não estuda a problemática das emissões de metano eventualmente causadas por fenómenos de eutrofização ou pela decomposição anaeróbica da matéria orgânica contida nos solos submersos.
Embora os estudos sobre esta matéria sejam ainda incipientes a nível internacional, é um tema que não pode ser desprezado, face à sua relevância potencial para e missão de GEE.
Segundo declarações públicas das autoridades portuguesas, o Governo, na sua resposta à CEDG Ambiente sobre os riscos do PNBEPH, refere que as lacunas do PNBEPH seriam colmatadas nos EIA (não conhecemos os termos exactos da resposta porque tanto o Governo Português como a CE se recusam a divulgá-la, apesar de repetidamente solicitada — no passado, este comportamento significou sempre respostas mal fundamentadas e nalguns casos falsas). Esta e outras falhas do PNBEPH não são respondidas no EIA do SEIT, nem o foram nos EIA já publicados de outros empreendimentos abrangidos pelo PNBEPH. Tudo indica que ficaram e ficarão sem resposta as questões essenciais levantadas pela Comissão Europeia.
Eficácia de medidas de minimização e compensação
As Directivas Aves e Habitats e a doutrina europeia nesta matéria exigem que a afectação de valores protegidos só possam ter lugar no caso da inexistência de alternativas (requisito manifestamente não cumprido pelo PNBEPH ou pelo SET) ou medidas de compensação eficazes em espécie e magnitude (requisito que as medidas propostas no EIA claramente não cumprem).
No que toca à qualidade da água, a DQA exige que a qualidade das massas de água seja melhorada para bons níveis — algo manifestamente impraticável se o SET for concretizado.
No que toca à economia e desenvolvimento local, as propostas do EIA estão no domínio da pura fantasia, nem merecem ser designadas como medidas.
Síntese
O EIA elege como alternativa ambientalmente mais favorável a não construção do aproveitamento hidroeléctrico de Padroselos nem da Derivação Alvadia-Viduedo-Gouvães, bem como as cotas mais baixas para os aproveitamentos do Alto Tâmega e Gouvães. É uma lógica de mal menor, compreensível face aos desejos manifestados pelo Governo, mas mesmo assim inaceitável numa perspectiva de custo/ benefício, de avaliação de impactes e de interesse nacional.
De facto, os impactes ambientais negativos decorrentes da construção do SET (mesmo na versão reduzida) seriam muito mais significativos do que quaisquer benefícios que daí possam advir. O SET declara objectivos aparentemente meritórios (redução da dependência energética e da emissão dos gases de efeito de estufa), mas para cujo cumprimento o próprio SET é marginal e provavelmente contraproducente, já que desincentiva projectos com melhor relação custo/benefício (investimentos em eficiência energética e outros).
Para além disto, este projecto irá afectar locais de grande importância ecológica e contribuir para a banalização das paisagens do País, destruindo locais de uma beleza natural única, cada vez mais rara, que deve ser preservada e valorizada, tanto numa perspectiva de legado às gerações futuras, como de potencial económico e desenvolvimento local.
Estamos perante um caso inequívoco de insustentabilidade, em todas as vertentes: social, ecológica e económica. Perante tal cenário, o GEOTA manifesta-se necessariamente contra a criação do Sistema Electroprodutor do Tâmega.
Referências
J.V. Simão (2009). Turismo como motor de desenvolvimento local: o caso do Vale do Tua. Dissertação apresentada na FCT-UNL para a obtenção do grau de Mestre em Engenharia do Ambiente.
Arcadis & Atecma (2009). Technical assessment of the Portuguese National Programme for Dams with High Hydropower Potential (PNBEPH). EC/DG Environment.
J.J. Melo (2009). Public works policy in Portugal: a case study in unsustainability. In: R. Silva & E. Tomé (Eds), Proceedings of MSKE 2009 — International Conference on Managing Services in the Knowledge Economy, 614-622. Universidade Lusíada. ISBN 978-989-640-460-0.
Património cultural
Em termos de património arqueológico, arquitectónico e etnográfico, o EIA refere que se trata de uma zona bastante sensível, pois possui diversos testemunhos antigos de ocupação humana. São identificados impactes em 50 ocorrências patrimoniais. Destaca-se, no caso do Aproveitamento de Gouvães, o impacte sobre o conjunto megalítico Chã das Arcas, classificado como Monumento Nacional. “Solução” apresentada pelo EIA: rever a classificação atribuída ao monumento, admitindo-se a sua desclassificação, dado o seu estado de degradação e reduzido interesse patrimonial e científico! Solução proposta pelo GEOTA: cancelar o SET, porque tem escassa utilidade e destrói elementos valiosos e insubstituíveis do património natural, cultural e paisagístico nacional.
Impactes cumulativos
O EIA do SET não estuda os impactes cumulativos com outros empreendimentos da bacia do Douro, designadamente em matéria de riscos para as populações locais, habitats protegidos, corredores ecológicos, qualidade da água e erosão costeira. É certo que a sede própria para este tipo de análise seria a avaliação ambiental estratégica do PNBEPH e/ou o plano de bacia do Douro; mas a primeira desprezou completamente o problema, enquanto o segundo está a dar os primeiros passos e não produzirá qualquer informação em tempo útil (além de as ARH terem recebido instruções do Governo para considerarem o PNBEPH como um dado adquirido).
O EIA não estuda a problemática das emissões de metano eventualmente causadas por fenómenos de eutrofização ou pela decomposição anaeróbica da matéria orgânica contida nos solos submersos.
Embora os estudos sobre esta matéria sejam ainda incipientes a nível internacional, é um tema que não pode ser desprezado, face à sua relevância potencial para e missão de GEE.
Segundo declarações públicas das autoridades portuguesas, o Governo, na sua resposta à CEDG Ambiente sobre os riscos do PNBEPH, refere que as lacunas do PNBEPH seriam colmatadas nos EIA (não conhecemos os termos exactos da resposta porque tanto o Governo Português como a CE se recusam a divulgá-la, apesar de repetidamente solicitada — no passado, este comportamento significou sempre respostas mal fundamentadas e nalguns casos falsas). Esta e outras falhas do PNBEPH não são respondidas no EIA do SEIT, nem o foram nos EIA já publicados de outros empreendimentos abrangidos pelo PNBEPH. Tudo indica que ficaram e ficarão sem resposta as questões essenciais levantadas pela Comissão Europeia.
Eficácia de medidas de minimização e compensação
As Directivas Aves e Habitats e a doutrina europeia nesta matéria exigem que a afectação de valores protegidos só possam ter lugar no caso da inexistência de alternativas (requisito manifestamente não cumprido pelo PNBEPH ou pelo SET) ou medidas de compensação eficazes em espécie e magnitude (requisito que as medidas propostas no EIA claramente não cumprem).
No que toca à qualidade da água, a DQA exige que a qualidade das massas de água seja melhorada para bons níveis — algo manifestamente impraticável se o SET for concretizado.
No que toca à economia e desenvolvimento local, as propostas do EIA estão no domínio da pura fantasia, nem merecem ser designadas como medidas.
Síntese
O EIA elege como alternativa ambientalmente mais favorável a não construção do aproveitamento hidroeléctrico de Padroselos nem da Derivação Alvadia-Viduedo-Gouvães, bem como as cotas mais baixas para os aproveitamentos do Alto Tâmega e Gouvães. É uma lógica de mal menor, compreensível face aos desejos manifestados pelo Governo, mas mesmo assim inaceitável numa perspectiva de custo/ benefício, de avaliação de impactes e de interesse nacional.
De facto, os impactes ambientais negativos decorrentes da construção do SET (mesmo na versão reduzida) seriam muito mais significativos do que quaisquer benefícios que daí possam advir. O SET declara objectivos aparentemente meritórios (redução da dependência energética e da emissão dos gases de efeito de estufa), mas para cujo cumprimento o próprio SET é marginal e provavelmente contraproducente, já que desincentiva projectos com melhor relação custo/benefício (investimentos em eficiência energética e outros).
Para além disto, este projecto irá afectar locais de grande importância ecológica e contribuir para a banalização das paisagens do País, destruindo locais de uma beleza natural única, cada vez mais rara, que deve ser preservada e valorizada, tanto numa perspectiva de legado às gerações futuras, como de potencial económico e desenvolvimento local.
Estamos perante um caso inequívoco de insustentabilidade, em todas as vertentes: social, ecológica e económica. Perante tal cenário, o GEOTA manifesta-se necessariamente contra a criação do Sistema Electroprodutor do Tâmega.
Referências
J.V. Simão (2009). Turismo como motor de desenvolvimento local: o caso do Vale do Tua. Dissertação apresentada na FCT-UNL para a obtenção do grau de Mestre em Engenharia do Ambiente.
Arcadis & Atecma (2009). Technical assessment of the Portuguese National Programme for Dams with High Hydropower Potential (PNBEPH). EC/DG Environment.
J.J. Melo (2009). Public works policy in Portugal: a case study in unsustainability. In: R. Silva & E. Tomé (Eds), Proceedings of MSKE 2009 — International Conference on Managing Services in the Knowledge Economy, 614-622. Universidade Lusíada. ISBN 978-989-640-460-0.
GEOTA - Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (Lisboa) - 14 de Abril de 2010
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