ALTO TÂMEGA - BARRAGENS
A permanente leveza da incredulidade
Se há domínio onde a estrutura governamental apresenta garantia de potencial elevado para intervenção, o território é seguramente um deles. Impressiona o número de membros do Governo que podem ter influência nas decisões, no mínimo de sete a partir de uma contagem prudente.
Sejam o ministro e secretário de Estado do Planeamento, o secretário de Estado da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território, a ministra da Coesão Territorial e secretário de Estado Adjunto, a secretária de Estado da Valorização do Interior ou o da Agricultura e do Desenvolvimento Rural. Mas, como quem estudou física bem sabe, a capacidade de gerar trabalho, medido pela energia cinética, está dependente de dois fatores: da massa e da velocidade do corpo em movimento.
O caso das famílias que terão que abandonar as suas casas, deslocando-se para contentores metálicos num parque de estacionamento, devido à construção de uma das barragens do Alto Tâmega, mostra que a inércia da enorme massa governamental pode afinal limitar uma velocidade aceitável na resolução de problemas. Sem pôr em causa o interesse público da barragem, parece óbvio que o problema da demolição de um conjunto de casas e a deslocação das famílias que nelas habitam deveria ter sido tratado com um cuidado bem distinto da simples aplicação do enquadramento legislativo padrão. Caso contrário, para que precisamos então de tantos e variados governantes para o tratamento e valorização do território?
No mínimo, parece razoável que a cada uma destas humildes famílias, de um modesto meio rural, tivesse sido garantido o direito de opção entre uma nova habitação em condições equivalentes, desejavelmente superiores, ou uma indemnização financeira a acordar com a multinacional concessionária.
E foi triste ver na televisão o presidente da Câmara a tentar uma solução tardia, através da oferta de um terreno passível de urbanizar, mas que aparentemente poderá não ser aceite.
Continuo incrédulo com a leveza de algumas decisões. Até porque é possível fazer bem melhor.
Emídio Gomes (Prof. catedrático, vice-reitor da UTAD) - in Jornal de Notícias - 6 de Novembro de 2019
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