PARLAMENTO - BARRAGEM DE FRIDÃO
“Não tenho a mais pequena dúvida que não há direito a qualquer restituição à EDP” à conta do recuo no Fridão
Ministro diz que há duas possibilidades para cancelar contrato do Fridão: ou por decisão da empresa ou por decisão do governo. Contudo, parecer jurídico do próprio governo coloca ónus apenas no Estado
João Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Transição Energética, voltou esta terça-feira a assegurar à Assembleia da República que a decisão de não avançar com a barragem do Fridão não vai dar direito a qualquer restituição à EDP, empresa que pagou 218 milhões de euros pela concessão deste projeto de aproveitamento hidroelétrico, suspenso em 2016.
“Tenho duas cartas onde, na primeira, a EDP diz que não faz sentido de fazer barragem, que é mau negócio, que há outras formas de produzir a mesma quantidade com menos impactos, e uma segunda em que a EDP ensaia a ideia de se fazer um ‘Fridão mais pequeno’. Essa proposta, que como engenheiro até me interessaria analisar, não seria possível pois esbarra logo nas regras de contratação pública. Como o projeto adjudicado não era aquele, juridicamente não era possível considerar a hipótese sugerida pela EDP”, esclareceu Matos Fernandes.
Assim, e tendo por base o que a EDP diz nestas cartas, explicou, o governo assumiu a falta de interesse da elétrica em avançar com o projeto e não se opôs a tal decisão, assumindo por isso que a barragem não iria avançar. Uma leitura com a qual a EDP está longe de concordar, admite, abrindo a porta ao avanço do caso para arbitragem: “A EDP não concorda com a nossa leitura das cartas, logo haverá mecanismos legais para dirimir a questão.”
218 milhões acrescidos de danos emergentes e lucros cessantes
Para Matos Fernandes, o projeto desenhado para o Fridão, tendo em conta a evolução da procura, do mercado e da tecnologia nos últimos anos, apresenta hoje “um VAL claramente negativo”, o que justifica a falta de interesse da EDP em avançar com o projeto. Contudo, e face à hipótese de recuperar o valor pago pela concessão, a EDP terá mudado de ideias, acusou.
“A EDP não quer fazer a barragem. Terá eventualmente mudado de ideias quando viu que não ia receber dinheiro”, disse aos deputados esta terça-feira, antes de assegurar não ter qualquer dúvida que a elétrica não vai receber um euro sequer. “Não tenho a mais pequena dúvida sobre quão sustentada é a nossa posição e de que não há direito a qualquer restituição.”
Mas o que pode estar em causa no cancelamento da barragem do Fridão serão bem mais do que os 218 milhões de euros pagos pela EDP. Tal como o ECO já escreveu, além do valor pago pela elétrica “a título de contrapartida financeira pela exploração” desta barragem, a elétrica pode também reclamar “danos emergentes” e “lucros cessantes” com o projeto, o que poderá aumentar o valor em discussão em mais algumas dezenas de milhões de euros.
Parecer jurídico aponta que EDP não pode desistir unilateralmente
Nas respostas aos deputados esta terça-feira, o ministro assegurou ainda que no contrato celebrado com a EDP em relação à barragem do Fridão estão previstas duas saídas para o caso do projeto não avançar: “O contrato é claro: na hipótese ‘A’, ou seja quando é a empresa a desistir, perde direito à restituição. Na hipótese ‘B’, se for o governo a desistir, tem de restituir o dinheiro. Não há hipótese ‘C’.”
Esta leitura, porém, choca com as informações que surgem num documento do próprio ministério quando, em 2016, avançou com a revisão do programa nacional de barragens. Na análise jurídica às implicações da suspensão de alguns dos projetos deste plano, o Governo assume, tendo por base um parecer emitido pelo CEJUR — Centro de Estudos Jurídicos do Minho –, elaborado a pedido do próprio Executivo, que existiam três saídas possíveis para Fridão: “Revogação unilateral do contrato por iniciativa do Estado”; “Cessação por mútuo acordo”; “Suspensão/adiamento do contrato por 3 anos”.
Ou seja, o parecer jurídico pedido pelo governo aquando da reavaliação das barragens aponta que nenhuma solução definitiva sobre o Fridão poderia partir por iniciativa exclusiva da EDP. Isto porque, e como cita o parecer solicitado ao CEJUR, em conclusão a que o MATE diz aderir, “num cenário de alteração dos pressupostos sobre os quais a política energética foi concebida, apenas ao Estado competirá decidir, em nome do interesse público, em que medida essa eventual alteração deve refletir-se nos contratos celebrados ou em vias de celebração”.
“Não tenho a mais pequena dúvida sobre quão sustentada é a nossa posição e de que não há direito a qualquer restituição à EDP“, apontou o governante durante uma audição na Comissão de Ambiente. O ministro voltou a recordar as cartas enviadas pela elétrica para sustentar a interpretação do Executivo de que foi da empresa que veio a decisão e não do governo.
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