AMBIENTE - TÂMEGA
Geota diz que novas barragens no Tâmega têm “muito betão, pouca produção”
O Geota – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente opõe-se à construção das três novas barragens da Iberdrola nos rios Tâmega e Torno e contesta os números da produção eléctrica apresentados pela eléctrica espanhola
Foi apresentado, no dia 9 de Fevereiro, pela Iberdrola, em Ribeira de Pena, o Sistema Electroprodutor do Tâmega (SET) – um conjunto de três barragens na bacia hidrográfica deste afluente do Douro onde serão erguidos os empreendimentos hidroeléctricos de Daivões, Gouvães (rio Torno, afluente do Tâmega) e Alto Tâmega.
A associação ambientalista fez contas e contesta o valor anunciado pela empresa de energia quanto à real produção destas obras. “Ao contrário do que afirma a Iberdrola – 4% do consumo eléctrico do País – o SET contribuirá apenas com 0,1% da energia nacional e 0,6 % da electricidade produzida”. A diferença explica-se com o critério de avaliação: a Iberdrola invoca a produção bruta, o Geota defende que “o que deve ser avaliado é a produção líquida. Isto é, a electricidade efectivamente injectada na rede nacional e pronta a ser consumida”.
Gouvães é a chave do SET, funcionando como uma central de potência: permite disponibilizar uma potência instantânea elevada, “desnecessária porque o sistema nacional já tem potência excedentária) mas no balanço final acrescenta muito pouca energia”, diz o Geota. A sua central será utilizada para bombear água de, e para, a albufeira de Daivões, através de um túnel hidráulico. Portanto, aos valores de produção de electricidade bruta anunciados para o SET (1 697 GWh/ano, segundo os dados oficiais) “tem de ser descontada a electricidade gasta a transportar água, o que faz descer a produção para valores líquidos muito mais baixos (333 GWh/ano) — ou seja, 0,6% dos cerca de 52 802 GWh/ano de disponibilidade de energia eléctrica para consumo nacional, em 2014”, salienta a mesma fonte.
SET é “uma fraude”
João Joanaz de Melo, do Geota, considera o SET “uma fraude”. O professor de engenharia do ambiente acusa o Governo de “laxismo”. “Quando, em Abril passado, se reavaliou o Programa Nacional de Barragens, por obrigação do acordo que suporta o Governo entre o Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV) e o Partido Socialista (PS), recusaram-se a olhar para o que ia ser feito no Tâmega. As obras ainda não tinham começado, de facto, e o acordo referia explicitamente este projecto. Havia alguns acessos, um túnel técnico e nada mais. O PS ignorou o acordo, o PEV deixou que fosse ignorado e o Governo fez de porteiro da Iberdrola, deixando-a entrar à vontade para destruir um rio que é ganha pão de centenas de famílias – na produção agrícola, no vinho verde, nos desportos de águas bravas”, diz aquele responsável.
“A criação de emprego é uma falácia, pois são postos de trabalho temporários. Por via da destruição dos solos férteis e do último rio com um grande troço livre em Portugal, destroem-se postos de trabalho locais na agricultura e turismo de natureza”, acrescenta Marlene Marques, presidente do Geota. Diz ainda que o retorno real das novas barragens do Tâmega é “insignificante” face aos impactes sociais, ambientais, culturais e económicos do projecto, e que com a evolução esperada das alterações climáticas na região mediterrânica, “tenderá a reduzir-se ainda mais nas próximas décadas”.
As novas barragens do Tâmega, em conjunto com Foz Tua (concessionada à EDP), fazem parte do Programa Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico e beneficiam de um subsídio directo do Estado de 21,6 milhões de euros, por ano, durante 10 anos.
Ana Brazão, do projecto Rios Livres Geota, integra a Comissão de Acompanhamento Ambiental do SET e avalia como “anacrónicas” estas construções. “Devíamos apostar nas alternativas, como o solar. O caminho devia ser remover barragens sem utilidade. Em Espanha, só na bacia do rio Douro, foram removidas 115 barreiras nos últimos anos, entre as quais três grandes barragens. Por cá, também no Douro, estamos a construir novas. Depois admiramo-nos com a falta de areia nas praias e de que os temporais de inverno invadam as marginais deste País. Se temos cada vez mais obstáculos à conectividade fluvial e ao transporte de sedimentos não podemos esperar ter uma costa segura”, realça Ana Brazão.
Ana Cordeiro de Sá, in Actual - 10 de Fevereiro de 2017
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