segunda-feira, 26 de julho de 2021

 

BARRAGENS - NEGÓCIOS

A quem aproveita?

Os 26 factos ainda sem resposta no negócio das barragens

Óscar Afonso 

Docente da FEP e sócio fundador do OBEGEF

Seria desejável compreender o motivo pelo qual o Estado não o exerceu o direito de preferência na venda das barragens. (...) Todos os impostos são devidos neste negócio, o IMI, o IMT, o imposto do selo e o IRC, não se aplicam benefícios fiscais e existem sólidos indícios da prática de crime de fraude fiscal

No passado dia 19, em representação do Movimento Cultural da Terra de Miranda (MCTM), Alberto Fernandes, José Maria Pires e eu próprio prestamos declarações na 5ª Comissão de Orçamento e Finanças, na Assembleia da República, no âmbito do negócio entre a EDP e a ENGIE e, em particular, no âmbito do subsequente processo de Inquérito levantado contra José Maria Pires. Nesta crónica pretendo dar conta dos 26 factos que o MCTM ainda hoje não compreende, mas que o futuro se encarregará de nos explicar.

Estivemos presentes porque um órgão do Estado Português, a Autoridade Tributária (AT), decidiu abrir um inquérito disciplinar a um cidadão que se empenhou na defesa da sua Terra e do seu país, cumprindo uma missão cívica, que ao mesmo tempo é um direito e um dever constitucional – 1º facto, o processo. Estivemos na casa da democracia, perante as Senhoras e Senhores Deputados, para dizer que entendemos esse processo como uma afronta, algo que pensávamos impossível numa democracia madura.

Quem mandou instaurar o processo fê-lo sobre um documento entregue por um grupo de cidadãos ao Senhor Presidente da República, a seu pedido. Assim sendo, pergunto-me: como se sentirão os cidadãos que fizerem doravante o mesmo? Esse documento foi elaborado a pedido, expresso e pessoal do Senhor Ministro do Ambiente. Quem abriu o processo justificou-se falsamente que esse documento era um parecer jurídico – 2º facto, o não parecer. Basta olhar para ele para se saber que não o é, o Governo sabia que não era e a AT para além de saber que não era, sabia também da participação cívica do José Maria Pires no MCTM.

A menos que o contrário seja provado, considero que o objetivo deste processo foi apenas um: calar um movimento cívico, o que é inaceitável numa democracia – 3º facto, a motivação para o suposto desejo de silenciar.

Dizem-nos que o processo foi arquivado. Mas, de facto, não foi. Teve uma consequência sancionatória. A Diretora Geral da AT determinou três consequências para o José Maria Pires que não se entendem nem se aceitam: não pode intervir em procedimentos da AT sobre o negócio da venda das barragens – 4º facto; não pode intervir em nenhum outro procedimento de qualquer contribuinte sobre idêntica factualidade – 5º facto; não pode intervir em nenhum outro procedimento a que sejam aplicáveis as mesmas normas legais aplicáveis à venda das barragens – 6º facto.

Foi lançada sobre o José Maria Pires uma suspeição generalizada, que é inaceitável e inconstitucional, prejudicando gravemente os seus direitos constitucionais. Nunca mais, na AT, se deve pronunciar acerca de nada que possa ter a ver com o negócio da EDP. O que potencialmente o impede de fazer seja o que for. Além disso, esta verdadeira sanção é para toda a vida, porque não tem nenhum limite temporal – 7º facto. Assim, um dos mais qualificados juristas portugueses em matéria fiscal é silenciado para sempre no seio da própria AT, onde já prestou dos mais relevantes serviços ao país.

Este comportamento inaceitável da AT está em linha com outros, de todos os organismos dependentes do Governo que intervieram no negócio da EDP, e que têm que ser esclarecidos.

Desde logo, do Senhor Ministro do Ambiente que: por um lado, alega que autorizou o negócio da venda das barragens do Douro Internacional apenas na componente ambiental do negócio, porque a matéria fiscal não é da sua competência, mas, por outro lado, declarou, 10 dias depois do negócio, que o que ele autorizou não estava sujeito ao pagamento de impostos – 8º facto; autorizou um negócio montado para fugir ao pagamento de impostos, apesar de estar avisado e consciente disso – 9º facto; não exigiu a revisão do valor da concessão, como condição da sua autorização, como devia, face à prorrogação de 2007, de Manuel Pinho, por um valor (660 milhões de euros) inferior em mais de mil milhões de euros ao valor real das barragens (1.700 milhões de euros) – 10º facto; autorizou a EDP a vender as barragens, quando esta estava em incumprimento generalizado e reiterado das suas obrigações contratuais emergentes do próprio contrato de concessão, nomeadamente em termos ambientais – 11º facto; insultou e denegriu publicamente o MCTM – 12º facto.

Mas também do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que: promoveu uma alteração legislativa, no artigo 60.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que assenta como uma luva aos interesses da EDP no negócio – 13º facto; acompanhou o Senhor Ministro do Ambiente na extraordinária declaração de que um dos maiores negócios do século, em Portugal, estava isento de todos os impostos – 14º facto.

Da Agência Portuguesa do Ambiente que: aceita e concorda que, em conformidade com o interesse da EDP, umas vezes as barragens do Douro Internacional sejam consideradas bens do domínio público e noutras bens privados da própria EDP – 15º facto; aceitou que a EDP transmitisse as concessões das barragens a uma empresa fictícia, que a própria EDP lhe anunciou que duraria apenas 100 dias – 16º facto; fez ressuscitar, como que por milagre, o direito de bombagem da água do rio Douro para o Sabor e o Tâmega, colocando estes rios a correr contrário ao longo de vários quilómetros, sem qualquer contrapartida para o Estado – 17º facto; validou um negócio que é uma clara construção abusiva para fugir ao pagamento de impostos – 18º facto; apesar de ter informado a AT de que as barragens eram bens do domínio público e, como tal intransmissíveis, permitiu a sua transmissão duas vezes, pela EDP e pela Engie, neste negócio – 19º facto.

Da Direção Geral do Tesouro e das Finanças (DGTF) que, chamada a pronunciar-se sobre os interesses patrimoniais e financeiros do Estado no negócio disse que não tinha tempo nem conhecimento para fazer essa análise, mas permitiu que ele se realizasse – 20º facto;

 

Da Parpública que fez o mesmo que a DGTF – 21º facto.

Da AT, que, pela mão da mesma Diretora Geral: despachou no sentido de que um negócio de venda de barragens paga imposto do selo e, de seguida, sobre o mesmo negócio vem dizer exatamente o contrário – 22º facto; despachou no sentido de que as barragens que estão no balanço das concessionárias devem pagar IMI e, menos de um ano depois, veio dizer o contrário, curiosamente, num processo da EDP – 23º facto.

Dos tribunais arbitrais que, aparentemente, manipularam a distribuição de um processo de impugnação da EDP contra a liquidação do IMI de uma das barragens do Douro Internacional, entregando-o a uma árbitra, que é também advogada e que decidiu quase sempre individualmente a favor dos impugnantes – 24º facto; decidiu a favor da EDP, dizendo serem bens do domínio público prédios que estavam no Balanço da EDP como bens privados, que na realidade são – 25º facto.

A esses factos, acrescem ainda um outro. Seria desejável compreender o motivo pelo qual o Estado não o exerceu o direito de preferência na venda das barragens – 26º facto. Efetivamente, tanto quanto se sabe, o Estado nem sequer terá estudado as vantagens e os eventuais inconvenientes no seu exercício, podendo assim ter lesado o interesse público.

Todos estes comportamentos, estranhos, diria mesmo bizarros, sistematicamente contra o interesse público, praticados por aqueles a quem cabe defendê-lo, são inadmissíveis, e sempre a favor da EDP. Até agora, não compreendemos o racional desses comportamentos, mas, como disse acima, estamos convictos que o viremos a conhecer, embora não se saiba quando.

O MCTM tem a certeza de que todos os impostos são devidos neste negócio, o IMI, o IMT, o imposto do selo e o IRC, que não se aplicam benefícios fiscais e que existem sólidos indícios da prática de crime de fraude fiscal. Mas temos dúvidas se estas instituições, que são as mesmas a quem cabe aplicar a lei, sejam capazes de o fazer, como o fazem a qualquer cidadão.

Por isso, pelas nossas dúvidas, aceitamos o convite para prestar declarações na 5ª Comissão de Orçamento e Finanças, na Assembleia da República, e fomos pedir às Senhoras e aos Senhores Deputados que continuem a sua ação de escrutínio e, também, dizer que confiamos que a intervenção da Procuradoria Geral da República nas investigações venha a fazer imperar o Estado de Direito neste negócio.


Óscar Afonso (Docente da FEP e sócio fundador do OBEGEF), in Expresso – 26 de Julho de 2021

terça-feira, 20 de julho de 2021

BARRAGENS - NEGÓCIOS: Grandes barragens contra o interesse público — Um novo episódio

 

BARRAGENS - NEGÓCIOS

Grandes barragens contra o interesse público — Um novo episódio

"Energia renovável" não pode ser uma palavra mágica para autorizar qualquer barbaridade.

Foi recentemente noticiado pela comunicação social que o Ministério Público e a Autoridade Tributária levaram a cabo buscas em instalações da EDP e da Agência Portuguesa do Ambiente (APA). Estas diligências decorrem das investigações ao negócio da venda de seis barragens da EDP a um consórcio liderado pela Engie, por suspeitas de fraude fiscal. É mais um episódio de uma longa sequência de negócios pouco claros envolvendo grandes barragens, em prejuízo do erário público e com danos ambientais e sociais severos.

O caso tem antecedentes nos Contratos de Aquisição de Electricidade (CAE) em 1996, substituídos em 2004 pelos Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC). Estes contratos concedem benefícios aos produtores de eletricidade, a pretexto da garantia de segurança da produção — mas em condições que foram muito além do necessário para garantir essa segurança, como aliás foi denunciado por múltiplos responsáveis e mereceu mesmo uma comissão parlamentar de inquérito. Este processo viria a ser conhecido como as “rendas eléctricas”.

O episódio mais degradante desta longa série é a promoção injustificada das grandes barragens. Refira-se que Portugal dispõe de cerca de 250 grandes barragens, a maioria construídas entre os anos 50 e os anos 90 do século XX. Hoje em dia, novas grandes barragens são desinteressantes: primeiro porque não são rentáveis, por motivos técnicos e climáticos; segundo porque geram impactes negativos crescentes, sociais e ambientais (desaparecimento da agricultura e do turismo locais, destruição de ecossistemas raros e ameaçados, degradação da qualidade da água, retenção de areias, entre outros).

Em 2004 foi aprovada a barragem do Baixo Sabor (EDP), em grosseira infração da legislação nacional e comunitária de conservação da Natureza e avaliação de impactes. Em 2007 foi criado o Programa Nacional de Barragens (PNBEPH), prevendo a construção de 10 novas grandes barragens. Estas barragens iriam produzir apenas 0,5% da energia do País, a um custo 2 a 3 vezes superior à média do mercado — um negócio sem qualquer interesse público, só possível graças à subsidiação involuntária das empresas eléctricas pelos consumidores, imposta pelo Estado.

Mal concebido e sofrendo de conflitos permanentes, o PNBEPH viria a ser cancelado em 2019, tendo sido apenas concluída a barragem de Foz Tua (EDP) e estando atualmente em construção o Sistema Eletroprodutor do Tâmega (Iberdrola). Todas estas barragens provocam impactes danosos, quer nas populações vizinhas quer no ambiente.

O caso mais mediático foi o da barragem de Foz Tua, que implicou a desativação da extraordinária linha do Tua, com o consequente empobrecimento da economia local e do ecossistema. Em todos estes casos, ficaram por cumprir parte das medidas de mitigação de impactes, que já eram muito insuficientes face à gravidade das consequências. Podemos exemplificar com o desprezo pela acessibilidade no Vale do Tua (EDP) e os conflitos com as populações locais no Alto Tâmega (Iberdrola).

Em conclusão, independentemente de eventuais responsabilidades ao nível fiscal ou criminal, a venda das barragens da bacia do Douro é forma de a EDP descartar responsabilidades por medidas de mitigação e compensação não cumpridas, livrando-se simultaneamente de empreendimentos sem interesse financeiro.

Podemos presumir que a motivação da Engie não é económica (estas barragens não são rentáveis), prendendo-se possivelmente com a opção de acrescentar ao seu portfólio uma fonte de energia rotulada como “renovável” — uma classificação tecnicamente errada, porque a água é renovável, mas os ecossistemas destruídos pelas albufeiras não. Talvez a Engie ignore estes factos, ou simplesmente não se preocupe com tais questões.

É verdadeiramente lamentável que o Estado Português pactue com este tipo de negócios. “Energia renovável” não pode ser uma palavra mágica para autorizar qualquer barbaridade.

João Joanaz de Melo, in ECONews (Capital Verde) - 20 de Julho de 2021

quinta-feira, 15 de julho de 2021

ALTO TÂMEGA - PONTE DE ARAME: Autarcas de Boticas e Vila Pouca de Aguiar reuniram com populações de Veral e Monteiros

 

ALTO TÂMEGA - PONTE DE ARAME

Autarcas de Boticas e Vila Pouca de Aguiar reuniram com populações de Veral e Monteiros


Fernando Queiroga e Alberto Machado, presidentes das autarquias de Boticas e Vila Pouca de Aguiar, reuniram no passado dia 14 de julho com as populações de Veral, concelho de Boticas, e Monteiros, concelho de Vila Pouca de Aguiar, para as informar sobre os últimos desenvolvimentos relativos à proposta apresentada pela Iberdrola, empresa responsável pela construção do Sistema Eletroprodutor do Tâmega (SET), para a reposição da Ponte de Arame, ligação pedonal que une as duas aldeias e que irá ficar submersa com o enchimento da barragem do Alto Tâmega.

Os dois autarcas referiram que a Iberdrola apresentou duas alternativas de ligação entre estas duas localidades, mas que nenhuma delas vai ao encontro das necessidades das populações afetadas, acrescentando que o descontentamento de ambos já foi comunicado à Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e à Comissão de Acompanhamento Ambiental do SET.

Os dois municípios querem que seja construída uma nova ponte de passagem pedonal entre as duas localidades sem que esta implique a exclusão da travessia pública de veículos sobre o coroamento da barragem, medida prevista no Plano de Ação para Compensação Socioeconómica e Cultural do SET.

in Diário Atual - 15 de Julho de 2021

sexta-feira, 9 de julho de 2021

ALTO TÂMEGA - PONTE DE ARAME: Iberdrola apresentou alternativas para reposição da Ponte de Arame Monteiros-Veral

 





ALTO TÂMEGA - PONTE DE ARAME

Iberdrola apresentou alternativas para reposição da Ponte de Arame Monteiros-Veral


No seguimento das reivindicações dos Municípios de Boticas e de Vila Pouca de Aguiar e das populações de Veral e Monteiros junto da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e da Comissão de Acompanhamento Ambiental do Sistema Eletroprodutor do Tâmega (CAASET), relativas à necessidade imperativa de reposição da ponte pedonal Veral / Monteiros, que será afetada pela albufeira da barragem do Alto Tâmega, a Iberdrola, empresa responsável pela construção do Sistema Eletroprodutor do Tâmega, apresentou no passado 30 de junho uma proposta com duas alternativas para garantir a travessia entre as duas povoações após o enchimento da futura albufeira.

A primeira alternativa consiste na relocalização da ponte de arame apenas como uma ocorrência patrimonial e sem qualquer função de ligação pedonal entre as duas margens, contemplando, no entanto, a existência de uma passagem rodoviária mais curta que a atual, sobre o coroamento da barragem, assim como a construção de acessos em ambas as margens

A outra alternativa prevê a construção de uma nova ponte, apenas pedonal, excluindo, contudo, a travessia de veículos, sendo o coroamento da barragem redefinido e adaptado apenas a uma via exclusiva para os trabalhos de manutenção da barragem. Nesta alternativa, não haveria lugar à recolocação da ponte de arame como ocorrência patrimonial.

Tendo tomado conhecimento das duas alternativas propostas, os Municípios de Boticas e de Vila Pouca de Aguiar já se pronunciaram junto da APA e da CAASET, manifestando a sua discordância face a cada uma das propostas. Isto porque os Municípios pretendem que seja construída uma nova ponte de passagem pedonal entre Veral e Monteiros (tal como preconizado na segunda alternativa), mas sem que tal implique a exclusão da travessia de veículos automóveis no coroamento da barragem. Até porque, como refere o Presidente da Câmara de Boticas, “Fernando Queiroga, “a passagem pública de veículos prevista sobre o coroamento da barragem nunca esteve em causa, nem muito menos dependente da construção, ou não, da travessia pedonal, pelo que nos opomos totalmente à retirada da função de circulação automóvel pública pelo coroamento da barragem”. Da mesma opinião partilha também o Presidente do Município de Vila Pouca de Aguiar, Alberto Machado, que lembra ainda que “a adaptação e beneficiação dos acessos em ambas as margens ao coroamento da barragem, para circulação automóvel, estão previstos no Plano de Ação para Compensação Socioeconómica e Cultural, para aproveitamento da barragem às características requeridas para utilização normal, o que inclui a adaptação da travessia por cima da barragem”.

De igual forma, os Autarcas exigem ainda que seja cumprido o Plano de Ação para Compensação Socioeconómica e Cultural no que diz respeito à relocalização da ponte de arame como uma ocorrência patrimonial, através da “desmontagem e remontagem dos seus elementos constituintes e o restauro dos elementos da ponte”, preservando o seu valor cultural e patrimonial, embora sem qualquer função de ligação pedonal.


in Notícias de Vila Real - 9 de Julho de 2021

terça-feira, 6 de julho de 2021

BARRAGENS - INVESTIGAÇÃO: Negócio das barragens motiva buscas na EDP, Agência do Ambiente e outras empresas

 

BARRAGENS - INVESTIGAÇÃO

Negócio das barragens motiva buscas na EDP, Agência do Ambiente e outras empresas

Venda de barragens à Engie provocou polémica - Foto: Arquivo / Global Imagens


O Ministério Público e a Autoridade Tributária estão, esta terça-feira, a realizar, buscas na EDP, na Agência do Ambiente e em outras empresas, no âmbito de uma investigação à venda de barragens à Engie.

Em causa está a venda de seis barragens, um negócio que levantou grande polémica. Há suspeita de fraude fiscal.

O JN sabe que o processo foi iniciado já em 2021 pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal de Lisboa. As operações de hoje visam a recolha de documentos e não está prevista a constituição de arguidos.

Em comunicado, o Ministério Público informa que "no âmbito de um inquérito dirigido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e cuja investigação se encontra a ser efetuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), realizam-se buscas em 11 locais do país, nomeadamente Lisboa, Porto, Amadora e Miranda do Douro. Estas buscas decorrem em instalações de barragens, escritórios de advogados, um organismo do Estado, uma sociedade de contabilidade e sociedades ligadas ao sector hidroelétrico."

Ao contrário do que foi inicialmente divulgado, as buscas estão a decorrer na Agência Portuguesa do Ambiente e não no Ministério do Ambiente.

A EDP confirmou que está a ser alvo de buscas e assegurou que "está a prestar toda a colaboração com as autoridades e mantém-se convicta de que a operação de venda cumpre todos os requisitos legais".

Intervém na operação 29 Inspetores da Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC​), 37 inspetores da Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais (DSIFAE), incluindo 10 especialistas do Núcleo de Informática Forense, sendo que a operação em curso, para além de elementos da UGC e da DSIFAE, conta ainda com 28 militares da Unidade de Ação Fiscal da GNR, incluindo dois especialistas em informática forense. Nas diligências participam sete magistrados do Ministério Público e cinco magistrados judiciais.

110 milhões de Imposto de Selo não pago

Em causa está a venda por 2,2 mil milhões de euros de seis barragens da EDP na bacia hidrográfica do Douro ((Miranda, Bemposta, Picote, Baixo Sabor e Foz-Tua) a um consórcio de investidores formados pela Engie, Crédit Agricole Assurances e Mirova, concluída em 17 de dezembro.

O Bloco de Esquerda (BE) tem defendido que, à luz deste negócio, deviam ter sido pagos 110 milhões de euros em Imposto do Selo, o que é contestado pela EDP.

A EDP considerou, em abril, que a venda da concessão das barragens ao consórcio da Engie não beneficiou de isenção do Imposto do Selo prevista na lei desde 2020, porque a forma como a operação decorreu não está sujeita ao imposto.

"A operação não está sujeita ao Imposto do Selo [IS] por não enquadrar na previsão normativa da verba 27.2 da TGIS [Tabela Geral do Imposto do Selo]", referiu a EDP, apontando que, "não havendo incidência, não se aplicarão as normas de isenção".

O entendimento da empresa presidida por Miguel Stilwell d'Andrade consta das respostas da EDP às 17 questões do Bloco de Esquerda e de outras consensualizadas pela comissão parlamentar de Ambiente, num total de 21, sobre o negócio da venda da concessão de seis barragens no Douro.

A diretora-geral da Autoridade Tributária (AT), Helena Borges, afirmou, em 14 de abril, perante os deputados da Comissão do Orçamento e Finanças, que, independentemente da discussão pública, a AT teria sempre analisado a operação de venda de barragens pela EDP à Engie.

Em resposta ao deputado do Partido Socialista João Paulo Correia, Helena Borges referiu que "sim, a Autoridade Tributária e Aduaneira está a tratar deste tema nas etapas que são próprias" e que "sim", teria "sempre tratado esta operação independente da sua discussão pública".

O ministro de Estado e das Finanças, João Leão, também ouvido pelos deputados, em março, afirmou que "o tempo de intervenção em matéria fiscal do lado do Estado começa agora", e reiterou que a AT tem "total autonomia" para atuar, sublinhando que "o Governo não interfere na atividade inspetiva da AT".

in Jornal de Notícias - 6 de Julho de 2021