Tâmega: Barragens na análise de MST
CÉU NUBLADO
No fio da navalha: é assim que estamos. Ou como
a orquestra do "Titanic", no último jantar a bordo, sem saber que
iria ter de tocar pela noite fora, ao longo do naufrágio.
(...)
Grécia, Portugal, Espanha e Itália, com
graduações diferentes, comungam de vícios idênticos: a aposta no papel
determinante do Estado na economia, que substitui a concorrência entre
empresas, baseada no mérito, pela promiscuidade entre o público e o privado,
fundada no favor e na influência política; o poder asfixiante dos lóbis e das
corporações de interesses socioprofissionais, que mantêm cativo o poder de
decisão e a capacidade de transformar e adaptar a economia às condições de cada
momento; e a crença de que um Estado e uma nação que se habituaram a viver
permanentemente acima da riqueza produzida estão em condições de enfrentar as
crises e ter credibilidade no mercado onde então vão procurar os financiamentos
de que necessitam.
(...)
Esta semana, Cavaco Silva, o mesmo, veio, mais
uma vez, manifestar-se preocupado por ver o país lançar-se de cabeça em mais
uma geração de grandes obras públicas, a pagar pelas gerações seguintes, e num
momento em que se encontra completamente endividado e na iminência de ver o seu
crédito esgotado nos mercados onde precisa de se financiar para sustentar a
própria dívida. Muita outra boa gente também acha isto uma aventura
perigosa. Mas nesta mesma semana,
a EDP avançou para o contrato da construção de uma megabarragem no Tâmega - uma
de seis e que, como as outras, vai também, e infelizmente, destruir uma das
mais bonitas paisagens do país, em troca de umas migalhas de KWs.
(...)
Não sei o que os mercados, os nossos credores,
pensarão de nos verem lançar mãos à construção de um aeroporto, do TGV, de uma
nova ponte em Lisboa, d eseis barragens e mais auto-estradas. Eu sei que o
nosso problema de fundo é o fraco crescimento económico e o desemprego: mas não
acredito que o caminho seja este e que, mesmo sendo, este seja o tempo, como
diz Sócrates.
(...)
Findos os trabalhos, todos os empregos
desaparecem: não são verdadeiros empregos, são ocupações temporárias. A dúvida
é, já que o Estado entende chamar a si o papel de motor da recuperação
económica, se não seria melhor e mais útil investir na economia real, onde
estão ou podem estar as pequenas empresas que duram mais de uma conjuntura?
(...)
Miguel Sousa Tavares, in Expresso - Primeiro Caderno (p. 9) - 8 de Maio de 2010
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